
Caraté, karaté (português europeu) ou caratê (português brasileiro) (em japonês: , transl. karate, AFI: [ktə]) ou caratê-dô (, transl. karate-dō AFI: [ktəd]) é uma arte marcial japonesa que se desenvolveu a partir da arte marcial autóctone de Oquinaua sob influência do chuan fa chinês e dos koryu japoneses (modalidades tradicionais de luta), incorporando aspectos das disciplinas guerreiras, ou budō.
A influência do chinesa foi maior num primeiro estádio de desenvolvimento, cambiando um paradigma primitivo de simples luta com agarrões e projeções para um com mais ênfase nos golpes traumáticos, e se fez sentir nas técnicas dos estilos mais fluidos e pragmáticos da China meridional. Depois, por causa de alterações da cércea geo-política, sobreveio a predominância das disciplinas de combate do Japão e nesse período o paradigma tende a simplificar ainda mais os movimentos, tornando-os mais directos com o renunciando àquilo que não seria útil ou que fosse mero floreio.
O repertório técnico da arte marcial abrange principalmente golpes contundentes — atemi waza —, como pontapés, socos, joelhadas, bofetadas etc., executadas com as mãos desarmadas. Todavia, técnicas de projeção, imobilização e bloqueios — nage waza, katame waza, uke waza — também são ensinados, com maior ou menor ênfase dependendo do onde ou qual estilo/escola se aprende.
Grosso modo, pode-se afirmar que a evolução desta arte marcial aconteceu capitaneada por renomados mestres, que a conduziram e assentaram suas bases, resultando no caratê moderno, cujo trinômio básico de aprendizado repousa em kihon (técnicas básicas), kata (sequência de técnicas, simulando luta com várias aplicações práticas) e kumite (enfrentamento propriamente dito, que pode ser mero simulacro ou dar-se de maneira esportiva/competitiva ou mais próxima da realidade). Esse processo evolutivo também mostra que a modalidade surgida como se fosse uma única haste acabou por se trifurcar e, por fim, tornou-se uma miríade de diversas variações sobre um mesmo tema.
O estádio da transição entre os séculos XX e XXI revela que a maioria das escolas de caratê tem dado ênfase à evolução do condicionamento físico, desenvolvendo velocidade, flexibilidade e capacidade aeróbica para participação de competições de esporte de combate, ficando relegada àquelas poucas escolas tradicionalistas a prática de exercícios mais rigorosos, que visam desenvolver a resistência dos membros, e de provas de quebramento de tábuas de madeira, tijolo ou gelo. De um modo simples, há duas correntes maiores, uma tendente a preservar os caracteres marcial e filosófico do caratê e outra, que pretende firmar os aspectos esportivo e lúdico.
A partir do primeiro quartel do século XX, o processo de segmentação instalou-se de vez, aparecendo diversos sodalícios e silogeus, até uus dentro dos outros, pretendendo difundir seu modo peculiar de entender e desenvolver o caratê, a despeito de comungarem de similitude técnica e de origem. Tal circunstância, que foi combatida por mestres de renome, acabou por se consolidar e gera como consequência a falta de padronização e entendimento entre entidades e praticantes. Daí, posto que aceito mundialmente como esporte, classificado como esporte olímpico e participando dos Jogos Pan-Americanos, não há um sistema unificado de valoração para as competições, ocasionando grande dificuldade para sua aceitação como esporte presente nos Jogos Olímpicos.
Em que pese a enorme fragmentação, os inúmeros contubérnios procuram ainda seguir um moldelo pedagógico mais ou menos comum. E neste ambiente, distingue-se o mero praticante, ou carateista, daquele estudioso dedicado da arte marcial, carateca, o qual busca desenvolver disciplina, filosofia e ética, além de aprender simples movimentos e condicionamento físico. Nessa mesma linha, aquele carateca que alcança o grau de faixa/cinturão preto(a) é chamado de sensei. E os sítios de aprendizado são chamados de dojôs, sendo estes, via de regra, filiados a alguma linhagem/estilo.
Ética e filosofia;
Além das mudanças para facilitar a divulgação do caratê, os mestres do começo do século XX (mormente Funakoshi, que aproveitou também esse aspecto da cultura japonesa, relevante naquele momento) foram eficazes em imprimir solenidade aos treinamentos, respeito para com mestres, instrutores e praticantes, de forma mútua, o que realça o carácter de formação de bons indivíduos. Isto, contudo, sem esquecer que naturalmente no processo de formação da arte marcial desenvolvia-se um paradigma para as condutas dentre e fora do sítio de treino. Neste ambiente, alguns dos mestres eram reconhecidos por sua moral e trabalhos nesse sentido.
O treinamento tradicional de caratê deve começar e terminar com um breve momento de meditação, mokuso, cuja finalidade é preparar o carateca para os ensinamentos que receberá e, depois, refletir sobre os mesmos. A cada momento ou exercício faz-se saudação no começo e no fim, sendo costume difundido em vários dojôs fazer uma reverência ao entrar e sair do sítio.
Esse carácter mais abrangente do caratê é bem visível pela partícula "dō" () de seu nome. Tais princípios, posto que a grande mudança filosófica ocorrida nas artes marciais japonesas possa ser localizada na transição do século XIX para o XX, possuem suas raízes fincadas bem mais no passado.
Historicamente, foi o monge Peichin Takahara quem primeiro a descreve a filosofia do "dō", do caminho de evolução que são as artes marciais, em sintonia com os ensinamentos do caratê. Ainda no século XVII, ele descreveu as três vertentes que, combinadas, culminam na evolução da pessoa: ijo, fo e katsu.
Ijo () pode ser expresso em atitudes pró-ativas em favor de terceiro. Também se diz que a forma ijo respousa na compaixão, humildade e no recato.
Fo (, princípio) é o compromisso, isto é, a dedicação que alguém tem para com algo; no caso, o afinco com que um carateca treina os conhecimentos ensinados, a seriedade e devoção que nutre, além, para com seu mestre e colegas.
Katsu (, observância) reflete-se no conhecimento, na compreensão que a arte marcial possui, mas compreendida nos mínimos detalhes e em que momentos, da vida ou de um enfrentamento real, farão sentido.
O conceito do caminho evolutivo que é a prática do caratê pode ser achado em todas as artes marciais japonesas, tratando-se uma leitura japonesa do tao. Como caminho, por conseguinte, deve ser interpretado de forma bem abrangente, para a compreensão de um ciclo de vida. De outra forma, uma vez que o ciclo da vida é já um caminho pré-determinado, um sistema no qual todas as formas e seres estão inter-relacionados, mister haver a consciência de que existe uma relação de interdependência de todas as coisas e situações: o aprendizado não seria mérito pessoal mas o resultado da relação voluntária do praticante com o ambiente e com todos os seres.
Nesta cércea, o caratê se insere como uma das disciplinas do Bushido, o código de ética do guerreiro. Assim, o caratê é muito mais do que uma forma de luta (o "dō" rejeita esta visão limitada), é um modo de vida. Os mestres prolataram um conceito, o que de nesta arte marcial, além de não existir atitude agressiva, em caso de embate, nunca o carateca faria o primeiro movimento:
“
Karate ni sente nashi
No caratê não há primeiro movimento (ataque)”
Sob duas ópticas capitais e pragmáticas, ressai o escopo pacífico da modalidade. Primeiro, caso se enfrentem dois caratecas, nenhum deles tomará atitude ofensiva, pelo que o combate nunca existirá. Depois, caso o enfrentamento se desse contra alguém que não é um carateca, com a atitude pacífica ou desestimularia o ataque ou, se esse existir, poder-se-ia usar da energia despendida pelo contendor para resolver a demanda. Trata-se destarte de uma abordagem complementar à do shinbu.
Graduação
Os mestres de caratê não usavam nenhum padrão para identificar o nível de cada apedeuta, de modo prosaico identificavam particularmente quem estava mais ou menos avançado nos conhecimentos. Paulatinamente, passou-se, de um jeito ou de outro, a se utilizar do sistema menkyo (vigente ainda nas escolas tradicionalistas) para certificar o grau de conhecimentos de um praticante, basicamente destacando-se três níveis:
Shodan (?): significando que se havia adquirido o status de principiante;
Chudan ( Chūdan?): significava a obtenção de um nível médio de prática. Isso significava que o indivíduo estava seriamente comprometido com sua aprendizagem, escola e mestre; e
Jodan ( Jōdan?): a graduação mais alta. Significava o ingresso no Okuden (escola, sistema e tradição secreta das artes marciais).
Se o indivíduo permanecia dez anos ou mais junto ao seu mestre, demonstrando interesse e dedicação, recebia o menkyo, a licença que permitia ensinar. Essa licença podia ter diferentes denominações como: Sensei, Shihan, Hanshi, Renshi, Kyoshi, dependendo de cada sistema em particular. A licença definitiva que podia legar e outorgar acima do menkyo, era o certificado kaiden, além de habilitado a ensinar, implicava que a pessoa havia completado integralmente o aprendizado do sistema.
Depois, sob a influência de Gichin Funakoshi, adoptou-se o sistema de faixas coloridas, que foi elaborado por Jigoro Kano para seus alunos, com o escopo de, além de deixar claro o nível do praticante, estabelecer um «caminho» a ser percorrido, o que era uma ideia muito cara à filosofia do dō/tao.
Inicialmente, em alguns casos (distinguir entre homens e mulheres ou níveis mais altos) os cintos de algodão cru usados não eram tingidos de modo uniforme, mas para se diferenciarem das outras artes marciais, havia a cor do grau ladeada por tingimento das bordas em cor distinta. Esse modelou não vigeu por muito tempo (alguns estilos ainda usam), passando a ser igual ao do judô. Por outro lado, posto que se almejasse estabelecer um modelo único (a ideia original), cada estilo/escola passou a estabelecer seus próprios graus e sequência de cores. Nesse mesmo espírito, alguns possuem cores diferentes para designar os graus mais elevados, por exemplo, com o cinto coral (vermelho e branco intercalados).
O sistema atual que rege a maioria das artes marciais usando kyu ("classe") e dan ("grau"), foi criado pelo fundador do judô. Kano era um educador e conhecia as pessoas, sabendo que são muitos os que necessitam de estímulos imediatamente depois de haver começado a praticar artes marciais. A ansiedade desse tipo de praticante não pode ser saciada por objetivos em longo prazo.
A graduação no caratê é importante para indicar o nível de experiência dos praticantes, e é vista como sinal de respeito para os atletas menos graduados. Para demonstrar a graduação os caratecas usam uma faixa com uma cor na região da cintura. A ordem das cores das graduações variam de estilo para estilo mas como padrão, o grau de intróito é marcao pela cor branca.
Na classificação de orientada por cores, o termo kyu significa classe, sendo que essa classificação é em ordem decrescente. Na classificação de mestres (com cinturão ou faixa pretos), dan significa grau, sendo a primeira faixa preta a de primeiro dan; a subsequente, o segundo dan'; e assim por diante em ordem crescente. Em um plano simbólico, o branco representa a pureza do principiante, e o preto se refere aos conhecimentos apurados durante anos de treinamento.
Desde que foi estabelecido e aceito o sistema de níveis coloridos, a graduação do caratê assemelhou-se muito ao seriamento escolar, num paradigma no qual os alunos galgam graus ascendentes (e mais complexos) até que obtenham o de mestre. No exame, são procedidos testes com diferentes características e exigências, de acordo com o grau de conhecimentos exigidos para o nível imediatamente anterior, ou seja, o aluno obtém a próxima graduação, se conseguir demonstrar que aprendeu a todo o conhecimento correspondente ao grau que ocupa e pretende superar; em tese, somente quando o aluno aprendeu tudo de um estágio é que está pronto para prosseguir no caminho do caratê. Habitualmente, também se exige certo período de tempo entre um exame e outro.
Não existe um consenso sobre os programas dos exames de faixa, variando de organização para organização, ou mesmo de dojôs.